Efeito Placebo e Autocura: SERÁ QUE FUNCIONAM MESMO?
- Dr. Rodrigo Tomaz
- 3 de nov. de 2022
- 5 min de leitura
Para dar início à nossa conversa, leia abaixo o interessantíssimo caso do Sr. Wright e o impressionante impacto do efeito placebo:
O PODER DA CRENÇA: O CASO DO SR. WRIGHT
O sr. Wright desenvolveu tumores do tamanho de laranjas em seu pescoço, virilha e regiões axilares, diagnosticados como linfossarcomas. Seu baço está aumentado e sua drenagem torácica obstruída, o que determinava punções (perfurações) torácicas diárias para drenar (retirar) volume de 1 a 2L de fluido. Infelizmente, sua resposta aos protocolos hospitalares de quimioterapia não foi favorável, e, consequentemente, ele estava sob assistência de oxigênio e apresentava anemia profunda.
Curiosamente, esse cenário mudou rapidamente porque o centro de oncologia norte-americano onde estava sendo tratado o submeteu a um protocolo de avaliação para uma nova droga que estava sendo pesquisada, derivada de soro equino e chamada de krebiozen. Apesar de o sr. Wright não preencher os critérios de inclusão da pesquisa, porque os pacientes tinham de ter um prognóstico mínimo de 3 meses para serem incluídos, ele expressou profundo desejo de que seu médico administrasse a ele a droga krebiozen. Graças a sua insistência, o seu médico atendeu à demanda e administrou a droga em uma sexta-feira. Na segunda-feira seguinte, seu médico declarou: “Eu o deixei febril, com falta de ar, completamente fragilizado. Agora, ele está assim, caminhando no corredor, cantando alegremente com as enfermeiras, e espalhando mensagens de otimismo para qualquer um que queira ouvi-lo. Imediatamente eu corri para observar os outros pacientes que receberam a primeira dose do medicamente no mesmo momento que ele. Nenhuma mudança, para melhor ou pior. Somente o sr. Wright teve essa melhora espetacular. Suas massas tumorais desapareceram como bola de neve em um forno quente, e, em apenas poucos dias de medicação, elas estavam medindo metade de seu tamanho original!”.
Depois de 10 dias, sr. Wright teve alta do hospital, ativo e respirando normalmente. De fato, ele continuou sua recuperação não convencional, até aproximadamente 2 meses depois, quando reportagens foram publicadas nos jornais afirmando a baixa taxa de sucesso do tratamento com a nova droga krebiozen. Isso, claramente, minou a confiança do sr. Wright e levou à recorrência da doença. Entretanto, depois de novo exame com seu médico titular, o sr. Wright foi orientado a não acreditar nas reportagens, e foi dito a ele que a injeção original de krebiozen que ele recebeu não estava no protocolo. O médico foi um pouco além – disse ao sr. Wright que o hospital havia recebido uma nova e extrapotente remessa de krebiozen e em poucos dias ele seria o primeiro a recebê-la. Dois dias depois, o sr. Wright foi novamente tratado, mas com soro fisiológico em vez de krebiozen. Em resposta ao tratamento, o sr. Wright mostrou uma nova recuperação não convencional. De fato, sua recuperação foi ainda mais intensa que a da primeira vez. Ele exibiu grande redução do tamanho do tumor, não necessitou de drenagem de tórax e mais uma vez estava sendo tratado ambulatorialmente. Pouco tempo depois, foi mandado para sua casa em tão bom estado que pôde pegar um voo comercial sem o uso de oxigênio suplementar.
Esse relato quase se parece com um final de filme hollywoodiano, mas não muito tempo depois a Associação Médica Americana declarou oficialmente que krebiozen era uma droga sem utilidade clínica. Depois de ler essa declaração, o sr. Wright experimentou uma recaída final, foi readmitido no hospital e faleceu 2 dias depois.
O caso do sr. Wright não é fictício e foi reportado primeiramente em 1957 pelo pesquisador pioneiro Bruno Klopfer para demonstrar a ação do poder da sugestão na direção da remissão de importante quadro tumoral, bem como em sua recidiva.
*Relato de caso clínico publicado na década de 1950.
O relato de caso acima ilustra o grande poder que a mente exerce sobre os processos de cura, exemplificado, no caso acima, pelo famoso "efeito placebo".
O livro "Bases da Medicina Integrativa" define placebo como "qualquer efeito atribuído a uma pílula, porção ou procedimento, mas não a suas propriedades farmacodinâmicas ou suas propriedades específicas."

O correto entendimento sobre o efeito placebo e suas repercussões é de fundamental importância para a Medicina Integrativa, tendo em vista que o principal objetivo é de sempre oferecer possibilidades de autocura e benefícios à saúde global do indivíduo.
O termo "efeito placebo" não é, nem de longe, novidade entre as pessoas. Contudo, é importante se dizer que o "placebo", é muitas vezes encarado como uma forma de "enganar a mente", o que nem de longe é verdade. Placebo não é sinônimo de enganação!
Seus efeitos fisiológicos são reais, podendo ser observados respostas como alterações de frequência cardíaca, pressão arterial, e ritmo respiratório, bem como de temperatura, além de serem observados eosinofilia e leucocitose (alterações em células sanguíneas). Essas respostas, por sua vez, ocorrem a depender de diversos fatores, como o tratamento proposto (quantidade, forma, cor, tamanho e brilho das pílulas utilizadas, por exemplo) e o ambiente em que ele ocorre, do paciente em questão (considerando sua personalidade, o sexo, idade, tipo de doença, sua cultura e crenças) bem como a relação médico-paciente.

Outro mecanismo do efeito placebo bastante interessante é o de condicionamento. Isso significa dizer que, quando uma resposta apresenta-se benéfica em um primeiro momento, esse benefício volta a ocorrer em uma nova intervenção durante o tratamento. Para ilustrar, podemos utilizar o seguinte exemplo: um paciente que cura a sua dor de cabeça com uma aspirina, pode voltar a sentir alívio quando numa próxima ocasião se lhe for oferecida uma pílula de aspecto semelhante, mas sem o princípio ativo contido nela.
Exames de imagem no cérebro humano (ressonância magnética) comprovam as alterações corporais anteriormente descritas. Descobriu-se, por exemplo, que resiliência e altruísmo, ligados ao córtex cingulado anterior, afetam positivamente a resposta ao placebo, enquanto raiva e hostilidade mediadas pela substância periaquedutal cinzenta, interferem negativamente.

Áreas cerebrais ativas durante situações de expectativa, conforme demonstrado em estudo de imagem.
O otimismo, a fé, a confiança e a crença em algo superior também influenciam significativamente a resposta ao placebo, conforme demonstram alguns estudos que avaliaram este efeito em casos de analgesia.
Os dados apresentados ao longo deste texto são mais uma prova da evidente interligação entre corpo e mente. E essa é uma das razões que a Medicina Integrativa se utiliza das crenças, religiosidade e fé dos indivíduos como um dos pilares no tratamento. A palavra de ordem nesse contexto é: RESPEITO.

O bom médico é aquele que não realiza discriminações das diversas possibilidades de crenças e religiões, e nem realiza imposições, mas sim aquele que, através de acolhimento e estratégias para o desenvolvimento da autonomia do paciente, o estimula não só a crença e resgate em seus sistema de crenças religiosas e fé, mas também o auxilia a tomar uma atitude de protagonismo no curso de sua saúde, bem estar e e de sua vida!
Saúde e Paz à todxs!
Dr. Rodrigo Tomaz
Medicina Integrativa
CRM/SP 185.006
Referências:
Bases da Medicina Integrativa. 2a ed. Barueri: Ed Manole; 2018.
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